Geopolítica do petróleo e gás natural
por Rui Namorado Rosa
I
Produção e investimento
II
Comércio internacional e petrodólar
III
Shale
IV
URSS, Rússia e BRICS
A agressividade militar exibida pelo imperialismo é intrínseca
à sua natureza. Mas a sua exacerbação e os focos em que
incide denunciam a sua voracidade relativamente a matérias-primas
essenciais, desde combustíveis fósseis a alimentos, a metais
básicos e especiais, etc., bem como o comando do seu comércio,
suas
rotas e destinos.
A turbulência de situação interna em muitos países e
nas relações internacionais tem frequentemente subjacente
problemas relativos ao aprovisionamento energético. No centro dessa
problemática situam-se os combustíveis fósseis, que ao
longo dos passados dez anos asseguraram uma elevada e estacionária
fracção 87% da energia primária consumida
globalmente. A contribuição da energia hidráulica cresceu
ligeiramente para 7% e da nuclear decresceu ligeiramente para 4%; as novas
renováveis subiram para não mais do que 3%. O peso relativo das
fontes primárias não sofreu alteração fundamental
nesta década, ao contrário do que os discursos oficiais sugerem,
e ainda que a tendência global de crescimento da produção e
consumo tenha persistido ao ritmo de 3% ao ano. Crescimento que só foi
possível porque a retracção da economia em muitos
países da OCDE (o dito "mundo ocidental") foi ultrapassada
pelo crescimento das ditas "potências emergentes" e muitos
países ditos "em vias de desenvolvimento". É um mundo
em profunda mudança.
A energia, colocando severos problemas técnicos quanto ao seu
armazenamento em larga escala, carece de vastas infraestruturas de transporte e
distribuição permanentes, dispendiosas e vulneráveis.
Rotas marítimas e terrestres colocam questões
geostratégicas; oleodutos e gasodutos são alvo de disputa.
Embargos, militarização e guerras visam assegurar ou negar acesso
a recursos e seu escoamento dentro da presente arquitectura imperialista.
I Produção e investimento
O acesso a fontes de energia e a disponibilidade de equipamentos de
extracção, conversão e transporte exigem investimentos
muito avultados, cujo montante global a Agência Internacional de Energia
AIE estima em US$ 40 milhões de milhões no período
2014 a 2035, um ritmo de investimento superior ao do passado recente, que foi
US$ 1,6 milhões de milhões no ano 2013, que já
representara uma duplicação relativamente ao ano 2000. A parte do
investimento no aprovisionamento de combustíveis fósseis duplicou
de 2000 a 2008, após o que o seu crescimento abrandou, atingindo US$ 970
mil milhões em 2013; deste total, a exploração e
produção (E&P) na indústria petrolífera absorveu
US$ 700 mil milhões; refinação e transporte (pipelines,
petroleiros, metaneiros e terminais associados) US$ 200 mil milhões;
carvão US$ 70 mil milhões. Este passado e o cenário da AIE
ilustram o esforço crescente que o aprovisionamento de energia vem
exigindo para assegurar o funcionamento da economia.
Mais de metade do investimento será requerido para mera
reposição da produção de petróleo e
gás em campos em declínio e substituição de grandes
equipamentos em fim de vida técnica útil. Significativamente,
quase dois terços do investimento localizar-se-á em economias
emergentes e na Ásia, África e América Latina. O
relatório da AIE também assinala a acentuada importância da
OPEP e do Médio Oriente no aprovisionamento futuro de petróleo
quando, a partir da próxima década, outras regiões
produtoras entrarem em declínio de produção. Incluem-se
nestas a Rússia e os EUA; o petróleo da Sibéria Ocidental
estará a atingir a sua capacidade de extracção
máxima, com reflexo no volume disponível para
exportação; nos EUA, o actual "boom" de
produção não convencional ("shale" e
"tight") poderá atingir não mais do que 4 Mb/d
(milhões de barris por dia) cerca de 2020, longe de poder inverter a
tendência de declínio em curso desde há quatro
décadas.
O agravamento do esforço a montante "upstream" ou seja
exploração e produção, abreviadamente E&P da
indústria petrolífera em manter e quanto necessário
ampliar a produção de petróleo e gás natural,
significa agravamento de custos e requer agravamento de preços. Apesar
da tendência ascendente dos preços do petróleo e
gás, as empresas do sector petrolífero têm registado
retornos sobre o capital médio aplicado (ROACE) que são hoje
menores, estando os preços de petróleo a flutuar acima de US$
100/b, do que eram em 2001, quando os preços do petróleo estavam
a menos de US$ 30/b Os custos de extracção mais do que
quadruplicaram desde 2000 para mais de US$ 21/b; e os custos de
exploração (descoberta de recursos adicionais) e de
desenvolvimento (de recursos já identificados) têm seguido uma
trajectória semelhante, atingindo quase US$ 22/b em 2013. Daqui se
infere que a obtenção do barril (ou quantidade de gás
equivalente) tende a exceder já US$ 60.
O esforço de investimento acumulado em E&P nos últimos seis anos
somou US$ 5,4 milhões de milhões, contudo relativamente pouco
resultou dele. Os custos da indústria petrolífera a montante
subiram três vezes desde 2000, contudo a produção aumentou
meramente 14%. O insucesso só tem sido disfarçado, e por
enquanto, na medida em que as grandes petrolíferas ainda continuam a
extrair das reservas de baixo custo que herdaram as jazidas gigantes de
petróleo e gás convencional descobertas há mais de
quarenta anos. Todavia a produção de campos convencionais atingiu
o pico em 2005, e nem um só novo grande projecto foi adicionado à
produção a custo inferior a US$ 80/b, em quase três anos.
O "syncrude", extraído das areias betuminosas de Alberta,
Canadá, tem custo de produção de pelo menos US$ 80. Quanto
ao óleo e gás de shales e outras rochas compactas, cuja
extracção nos EUA se acelerou em anos recentes, o custo marginal
de produção é superior a US$ 85/b em alguns dos
empreendimentos. Mais geralmente, a indústria prevê aplicar US$
1100 milhão de milhões ao longo da próxima década
em projectos que exigirão preços acima de US$ 95/b para serem
remunerados. A indústria foi levada a procurar novos recursos em
águas profundas ao largo da África, Sul América, Sudeste
Asiático e Árctico, onde é muito mais difícil de
pesquisar e produzir; alguns dos projectos em águas profundas do
Árctico requerem no mínimo US$ 120/b.
II Comércio internacional e petrodólar
A produção mundial de "todos líquidos"
classificados como petróleo atinge 90 Mb/d (1 Mb/d = 1 milhão de
barris por dia), dos quais já somente 65 Mb/d é petróleo
convencional.
O comércio internacional de petróleo atinge cerca de 40% desse
montante o restante sendo consumo interno dos países
exportadores. Os dois maiores exportadores destacados são a
Arábia Saudita e a Rússia (8,8 e 7,2 Mb/d em 2012); outros
grandes exportadores são os Emiratos Árabes, Kuwait, Iraque,
Nigéria, Qatar, Irão, etc. Do lado dos importadores destacam-se
os EUA, a China e o Japão (7,4, 5,9 e 4,6 Mb/d em 2012); outros grandes
importadores são a Índia, Coreia do Sul e Alemanha, etc.
A produção mundial de gás natural ascende já a 9,3
Gm3/d de "gás seco" (1 Gm3/d = mil milhões de metros
cúbicos por dia) produção equivalente a 61 Mb/d de
petróleo. O respectivo comércio internacional atinge 3,0 Gm3/d,
ou seja cerca de 30% da produção em menor
proporção que o petróleo; a menor portabilidade do
gás explica também a mais acentuada regionalização
do seu comércio através de gasodutos; porém o volume
transaccionado por via marítima na forma de gás liquefeito (GNL)
em metaneiros já abrange cerca de 30% do comércio internacional.
Os maiores exportadores são a Rússia e Qatar (0,57 e 0,33 Gm3/d
em 2012); outros exportadores de relevo são a Noruega, Canadá,
Holanda, Argélia, Turquemenistão, etc. Quanto aos importadores,
relevam o Japão e a Alemanha (0,33 e 0,25 Gm3/d em 2012); outros grandes
importadores são a Itália, França e China, etc; os EUA
registaram saldo importador de 0,12 Gm3/d.
O dólar (US$) é utilizado na cotação do
petróleo e do gás natural no comércio internacional. Em
1971, os EUA negociaram com a Arábia Saudita um acordo segundo o qual,
em troca de armas e protecção diplomática e militar, este
país passaria a realizar todas as transacções de
petróleo em US$; de seguida, outros países da OPEP aderiram a
acordos semelhantes, consolidando um mercado que se vinha delineando desde o
fim da II Guerra Mundial, e que garantiria uma procura global e continuada de
dólares norte-americanos. Pela mesma altura, os EUA terminaram
definitivamente a convertibilidade do dólar no tradicional
padrão-ouro; a partir daí o dólar consolidou a sua
posição de privilégio entre as demais divisas. Por esse
tempo os EUA eram os maiores produtores, consumidores e importadores de
petróleo do mundo, e o ano 1971 assinala também a passagem do
máximo absoluto de produção de petróleo nesse
país. Os grossos fluxos de dólares com origem no comércio
de petróleo passaram a ser designados de petrodólares. Os
incrementos de cotação do petróleo em 1973 e 1979 (datas
de choques petrolíferos) viriam a avolumar grandemente os fluxos de
petrodólares e a sua aplicação pelos principais membros da
OPEP em investimentos externos.
O preço do barril de petróleo, depois de exibir saltos
substanciais em 1973 e 1979, oscilou na banda US$ 15-40 entre 1983 e 2004, com
um pico singular em 1990; desde então exibe tendência ascendente,
tendo ultrapassado uma grande oscilação em 2008, e encontrando-se
agora a oscilar um pouco acima de US$ 100/b.
Essas variações reflectem tensões entre oferta e procura,
inevitáveis dilacções de investimento na
exploração e desenvolvimento de recursos e na capacidade de
refinação instalada, e bem assim, expansões ou
recessões económicas em espaços alargados. E é
evidente a sua interdependência com incidentes geopolíticos e
episódios económico-financeiros, com destaque para intencionais
manipulações, embargos e outras agressões
económicas. Na década de 80, a competição por cotas
de exportação entre países do Médio Oriente membros
da OPEP, gerando o incremento das respectivas exportações
invocando incrementos (não comprovados) das respectivas reservas que
serviam de base ao cálculo das cotas, manteve o preço do barril
artificiosamente baixo e submergiu o mundo em petrodólares. O colapso da
URSS ocorreu de par com a respectiva sobreprodução e sequente
quebra drástica de produção petrolífera, de quase
50%, de 12 para 7 Mb/d, no período entre 1988 e 1995. Depois, entre 1995
e 2003, o programa "oil for food" imposto pela ONU ao Iraque serviu
entre o mais para continuar a manipular a cotação e o
comércio internacional do petróleo. Após o que a
cotação disparou.
III Shale
A extracção de recursos de óleo e gás não
convencionais, de acessibilidade difícil, designadamente os contidos em
rochas compactas (baixa porosidade e baixa permeabilidade) "shale
oil" e "shale gas" (rochas predominantemente argilosas) e
"tight oil" e "tight gas" (rochas carbonatadas e
siliciosas) permitiu o incremento da produção
norte-americana verificada em anos recentes. Tal extracção foi
viabilizada por tecnologias perfuração horizontal e
fracturação hidráulica em múltiplas etapas
desenvolvidas e aplicadas há décadas na produção
"estimulada" de recursos convencionais. A sua extracção
coloca exigências e gera impactos muito significativos: a
aquisição de direitos e licenciamento sobre áreas muito
vastas, elevado número de plataformas de perfuração e a
continuada perfuração de novos poços (mesmo que só
para manter o nível de produção); exige caudais de
água abundantes e a sua deposição; induz sismicidade e
fuga de hidrocarbonetos voláteis, etc.; os riscos são diversos e
ponderosos.
Os EUA são pioneiros no desenvolvimento destes recursos. Entre 2006 e
2012, a produção de hidrocarbonetos não convencionais nos
EUA aumentou: gás treze vezes para 750 Mm3/d (1 Mm3/d = 1 milhão
de metros cúbicos por dia), o equivalente a 4,8 Mb/d de petróleo;
e petróleo sete vezes para 2 Mb/d. Esta produção adicional
viabilizou os EUA assumirem um importante protagonismo na
manutenção do nível da produção mundial.
Enquanto algumas formações geológicas Barnett,
Haynesville, Marcellus e Fayetteville foram as principais contribuintes
para a expansão do "shale gas", Bakken e Eagle Ford são
os principais contribuintes para o "tight oil". A importante bacia
Pérmica, em fase atrasada no que toca a recursos não
convencionais, está a ser agora desenvolvida; prevê-se uma taxa
média de investimento de US$ 30 mil milhões/ano entre 2014 e
2018, e que venha a contar um máximo de 5500 poços em 2017; com
produtividade por poço de 200 a 1000 b/dia, admite-se que em 2020
alcance a taxa de 1,8 Mb/d, ultrapassando a produção de
"tight oil" de campos congéneres. Em sentido contrário,
recursos identificados na formação "Monterey Shale",
Califórnia, supostos os mais vastos de shale nos EUA, foram recentemente
reavaliados pela Energy Information Agency EIA, e o volume
recuperável reduzido drasticamente, de 13 700 para 600 Mb, o que ilustra
a margem de incerteza e risco incorridos na avaliação de recursos
não convencionais.
De acordo com a EIA, o considerável potencial de óleo e
gás não convencional em rochas compactas deverá habilitar
os EUA a aumentar significativamente e manter a sua produção de
hidrocarbonetos ao longo dos próximos 15 anos: a produção
de gás não convencional poderá chegar a 1,12 Gm3/d
(equivalente a 7,3 Mb/d de petróleo) em 2035 (50% da
produção total de gás natural nessa data). E a
produção de petróleo não convencional poderá
crescer de 2,3 Mb/d em 2012 (cerca de 35% do total de ramas) até 4,8
Mb/d em 2021 (cerca de 50% de então) para declinar depois, ao passar ao
desenvolvimento de áreas menos produtivas. Ao contrário do que
certas entidades querem fazer crer, mesmo que os EUA pudessem efectivamente
tornar-se exportadores de gás a partir de 2020, a auto-suficiência
em termos de petróleo é uma meta de todo irreal.
Embora a extracção de hidrocarbonetos de rochas compactas tenha
aumentado a bom ritmo, os operadores têm incorrido em rápido
endividamento, posto que o custo e a continuidade do investimento requerido
não é remunerado pela receita gerada. A fracção
gasosa extraída tem sido secundarizada porque a respectiva
remuneração é menos favorável do que a da
fracção líquida; todavia é a mais propagandeada,
posto que os EUA são quase auto-suficientes em gás natural, e
poderiam teoricamente vir a tornar-se exportadores, se efectivamente
dispusessem das infraestruturas de transporte e terminais para procederem
à exportação o que não é o caso nem
concretizável senão a médio prazo. A
"revolução do shale" terá de confinar-se aos
denominados "sweet spots" de mais alta produtividade, a ritmos de
extracção comensuráveis com os volumes de recurso
acessível e recuperável, e aos tempos de vida técnica e de
eventual retorno do capital.
"Quem pode, ou vai querer, financiar a perfuração de
milhões de hectares e centenas de milhar de poços em
prejuízo permanente?", escreveu Ivan Sandrea, investigador no
Oxford Institute for Energy Studies, num relatório no mês passado.
"A benevolência dos mercados de capitais dos EUA não pode
durar para sempre." A despesa não pára nunca, disse Virendra
Chauhan, analista de petróleo na Energy Aspects. Como o output de
poços de shale declina drasticamente logo no primeiro ano, os produtores
têm de continuar a perfurar mais e mais poços para manter a
produção; o que implica vender activos e angariar mais
crédito. "Todo o "boom" em shale é na realidade
uma tarefa infindável de dispêndio de capital e de
endividamento". O acesso ao mercado de obrigações de alto
rendimento tem permitido às empresas de E&P gastar mais dinheiro no
shale do que conseguem gerar. Empresas de E&P classificadas de lixo gastaram
US$ 2.11 por cada US$ 1 ganho no ano passado, segundo uma análise de 37
empresas feita pelo Barclays (extracto/transcrição da
Bloomberg,
30 de Abril 2014).
A competição dos EUA com a Rússia e outros grandes
produtores do Médio Oriente para o aprovisionamento do mercado mundial
é puramente virtual. Embora os recursos sejam muito amplos, as
áreas com teor elevado e produtivas são escassas, e a taxa de
recuperação realizável modesta. Outras vastas jazidas de
shale existem na Rússia (formação Bazhenov na
Sibéria Ocidental), China (bacia Sichuan), Argentina (bacia Neuquen),
Colômbia/Venezuela (bacia Maracaíbo), México (bacia
Burgos), Líbia (bacia Syrta), etc., sem que contudo tenham sido alvo de
desenvolvimento tão significativo. Também na Europa
(Polónia, Ucrânia, França, Reino Unido, etc.) estes
recursos têm sido promovidos, mais por razões políticas do
que viabilidade económica, suscitando viva contestação
popular pela sua escala extensiva e pelos impactos ambientais da
fracturação hidráulica e da utilização
intensiva de água; ainda sem concretização.
[NR]
IV URSS, Rússia e BRICS
Os projectos do imperialismo parecem dar uma elevada prioridade ao
aniquilamento económico e político da Rússia, a maior
potência energética mundial, seguindo uma abordagem paralela ao
sucedido com a desintegração da URSS. Então, a
administração norte-americana lançou uma ofensiva
militarista conhecida por "guerra das estrelas" e uma ofensiva
económica visando deprimir o preço do petróleo de que
então dependiam as receitas de comércio externo e o
orçamento da URSS; o preço, cuja média ficara por US$ 18
entre 1950 e 1972, de 1973 a 1981 ascendeu até US$ 86, suportando o
fortalecimento económico da URSS; pelo contrário, decresceu
posteriormente, incluindo uma queda abrupta em 1986, até ao nível
de US$ 28 em 1989. A depreciação foi prosseguida na década
de 90, mantendo o sufoco dos países da CIS e obstaculizando o seu
desenvolvimento. A economia real e a crise do sistema financeiro parecem ter
depois prevalecido sobre os mecanismos de manipulação do
dólar e das commodities. De 2000 a 2013 o preço do
petróleo triplicou para cerca de US$ 110 (o do ouro sextuplicou para
cerca de US$ 1500), acompanhando os custos de investimento e de
produção, e a deslocação do crescimento
económico para as "economias emergentes", assim conferindo
renovado protagonismo aos países exportadores de petróleo (e
outras matérias-primas).
A Rússia tem sido o maior exportador mundial de energia, compreendendo
petróleo e gás, e bem assim de combustíveis e
serviços nucleares, como também de diversas
matérias-primas minerais. Em 2013, as exportações de
combustíveis fósseis ascenderam a US$ 362 mil milhões e de
combustível nuclear a US$ 72 mil milhões (no total quase 18% do
PIB).
Algumas fontes indiciam esse projecto imperialista de conduzir a Rússia
à falência e ao caos económico e social. Designadamente
a
Forbes
desvenda o propósito de "estabilizar" o dólar por
forma a trazer o preço do ouro para US$ 550/onça e do
petróleo para US$ 40/b; e adiciona que tanto não seria preciso
para terminar com o "aventureirismo" russo, US$ 80/b já seria
bastante. A tarefa seria cometida à Reserva Federal na forma de
"estabilização" do preço do ouro na COMEX (bolsa
de commodities) seguindo um script já previsto numa proposta legislativa
("monetary reform bill", H. R. 1576) e que merece na
Forbes
o título "É tempo de levar a Rússia à
falência outra vez" (assinado Louis Woodhill, 3 de
Março, 2014).
Para que esta abordagem possa ser sucedida será fundamental que o
dólar mantenha o seu papel hegemónico no sistema financeiro
mundial, particularmente como divisa de referência no comércio do
petróleo e gás o que é algo que contraria o
entendimento e os interesses das economias emergentes e se encontra no centro
de disputa.
Outra abordagem convergente seria saturar o mercado com petróleo de
outras origens um cenário publicitado como eminente, tal
propaganda de guerra, sob a designação de
"revolução do shale" liderada pelos EUA. O que na
realidade é impossível num mercado mundial já estrangulado
por força das limitações de capacidade de
produção por parte dos países exportadores e da
desactivação parcial da produção ou do
trânsito em países vítimas de
"revoluções coloridas", "primaveras
Árabes" ou alvo de sanções económicas.
Da
Bloomberg
: "A ideia antes impensável de exportar grandes quantidades de
petróleo e gás natural dos EUA ganhou apoio, na medida em que
avanços nas técnicas de perfuração colocaram os EUA
em vias de ultrapassar a Arábia Saudita e a Rússia como o maior
produtor mundial de petróleo em 2015, de acordo com
projecções da Agência Internacional de Energia. Em Novembro
(2013), os EUA produziram mais óleo do que importaram, pela primeira vez
desde 1995."
Tal análise está completamente falsificada; actualmente os EUA
são importadores líquidos de petróleo e de gás; no
médio/longo prazo a exportação de gás poderá
acontecer, daqui a uma década, se até lá forem geradas
sobreprodução e infraestruturas para a exportação
marítima; mas a de petróleo não terá nunca qualquer
viabilidade, a menos de um colapso do consumo doméstico nos EUA. No ano
2013, os EUA produziram 0,68 Tm3 de gás natural, mas registaram uma
importação líquida de 0,037 m3, comparável à
importação registada pela Ucrânia. Entretanto, na Europa
(35 países), o consumo de gás natural decresceu 10% de 2008 a
2013, atingindo 0,53 Tm3 no ano passado, bem aquém do consumo registado
nos EUA 0,72 Tm3. Já quanto ao petróleo, no início
de 2014 a importação de ramas petrolíferas pelos EUA
ascendeu a 7,6 Mb/d e o comércio de refinados teve balanço
exportador de 1,9 Mb/d, o que resultou numa importação agregada
de 5,7 Mb/d, para satisfazer o consumo total de 18,3 Mb/d; portanto o consumo
interno dos EUA depende da importação em cerca de 30%; nem as
projecções oficiais da Energy Information Agency EIA
prevêem qualquer balanço exportador no futuro.
A recente sexta cimeira dos BRICS (Fortaleza, Julho de 2014), reafirmou e
ampliou o compromisso dos seus cinco membros na prossecução dos
objectivos fixados nas precedentes cimeiras, incluindo na vertente financeira a
criação do Banco de Desenvolvimento e do Fundo de
Emergência. Os líderes da UNASUR e da CELAC foram convidados e a
oportunidade propiciou numerosos encontros de alto nível
incluindo várias visitas de estado dos presidentes Xi Jinping e Vladimir
Putin, e a Cúpula de Líderes da China e de Países da
América Latina e Caribe e numerosos acordos de
cooperação bilaterais e multilaterais foram subscritos. Os BRICS
assumiram projectos nos domínios de infraestruturas e da energia no
continente; nomeadamente um acordo entre a Rosneft e a Petrobras com vista
à exploração de gás natural no Amazonas; um outro
entre a Rosatom e Argentina para desenvolvimento da produção
nuclear neste país; o Brasil e China subscreveram 60 acordos, entre
tratados, memorandos de entendimento e contratos entre empresas; o
lançamento do plano de ligação ferroviária
transcontinental do Pacífico (Peru) ao Atlântico (Brasil) em
parceria com a China.
A correlação de forças continua mudando aceleradamente. O
petróleo e o dólar continuam a ser protagonistas, alvos e
indicadores, dessa mudança.
[NR]
Os que acreditam no mítico
boom
energético dos EUA podem ler, por exemplo,
Cold, Hungry and in the Dark Exploding the Natural Gas Supply Mith,
de Bill Powers , New Socierty Publishers, Gabriola Island (Canadá), 2013, 314 p., ISBN 978-0-86571-743-5.
Ver também:
As sanções contra Rússia e o pico petrolífero
A centralidade ignorada do Pico Petrolífero
Pico da produção petrolífera: Os países que já o ultrapassaram e aqueles que ainda não
O original encontra-se em
O Militante
. Nº 332, Set/Out 2014
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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