Uma "Guernica económica" para a Grécia
por Joseph Halevi
A Grécia enfrenta uma verdadeira Guernica económica, um massacre,
face ao qual a esquerda europeia mostra uma passividade imperdoável.
Aquilo que é imposto a Atenas é concebido como um exemplo, para
criar horror na Espanha, Portugal e mesmo na Itália. Mas até a
França, diante das directivas alemãs, entrou em colapso como num
novo teste de Sedan, o qual é também económico.
No Verão passado, Angela Merkel permitiu que Berlim incorresse em
défices, moderando o fanatismo protestante do então ministro das
Finanças social-democrata. Agora, com Schäuble naquele
ministério, estamos outra vez sob a total maldição
bíblica.
De acordo com inquéritos, a opinião pública europeia tende
a aceitar o argumento de os gastos deficitários serem equilibrados por
cortes drásticos. Tal argumento é equivalente a igualar o estado
a uma família que gasta mais do que ganha e é então
forçada a reduzir o seu padrão de vida. O Estado podia
encontrar-se nesta situação se se verificasse o pleno emprego
como uma tendência natural. Ponde de lado tal quimera, o défice
sempre pode ser financiado, desde que a autoridade que nele incida tenha
controle tanto sobre a política monetária como fiscal, o que
é impossível sob o euro.
Naturalmente, sob o euro, as relações capitalistas dentro da
Europa são definidas de modo a que haja aqueles que podem e aqueles que
não podem. Aparte o fanatismo ideológico, o rápido retorno
de Berlim à ortodoxia financeira decorre de uma visão muito
simples. Nós, dizem os dirigentes de Berlim, não daremos um
dólar para a Europa (neste caso a Grécia e a península
ibérica) porque nem meio tempo o nosso capitalismo saiu da crise
graças às exportações líquidas. O
congelamento de salários provocado pelo desemprego faz-nos
confortáveis ao passo que os nossos mecanismos internos de
subsídios, tanto ao nível federal como aos estaduais, facilita a
reestruturação. Isto e a deflação salarial
potenciarão a competitividade inter-capitalista da Alemanha.
Quem se importa com o cidadãos da Grécia e da península
ibérica? A única preocupação é como proteger
os valores financeiros dos bancos franceses e alemães que possuem
títulos do governo emitidos por aqueles países. Vagos sinais de
possíveis empréstimos para a Grécia são de facto
destinados apenas para esse efeito. Os cortes impostos a Atenas deveriam
tranquilizar os mercados, pois na verdade eles têm tido êxito,
apesar da reviravolta que estão a provocar na economia do país.
Assim chegou-se a um acordo extremamente duro entre Paris, Berlim, Frankfurt
(sede do Bundesbank e o BCE seu aliado) com as agências de
classificação, as quais avaliam a solvência dos emitentes
de títulos, as próprias agências que até há
poucos meses tanto a França como a Alemanha estavam a apontar o dedo
como estando entre as principais culpadas pela crise financeira.
Os "mercados" estão a actuar como tubarões a rapinarem
a Grécia com o apoio daqueles que primeiro os criticaram. O ano de 2008
nunca aconteceu, poderia dizer o falecido Jean Baudrillard. O populismo
anti-financeiro de Merkel, Lagarde e Sarkozy (bem como de Tremonti) já
mostrou o que vale. Produto temporário, é uma confusão
entre a miopia da França com o capitalismo da Alemanha. Ao afundar a
Grécia e forçar a Espanha e Portugal a segui-la, Frankfurt e
Paris estão de facto a atacar um grupo de países que, na
explosão da crise, isto é, até 2008, representavam mais de
9% das exportações italianas e mais de 10% das francesas, assim
como 6% das alemãs.
E agora a crise de novas escapatórias, não percebida, assoma no
horizonte, devido ao crescimento da China como um exportador líquido
para a Europa. Enquanto isso, a Grécia continua a ser uma área de
reciclagem para a indústria militar alemã: a
aquisição de 150 tanques Leopard, concluída em Outubro
último, não foi suspensa, mesmo no momento em que pensões
e salários estão a ser cortados.
O original, "Una 'Guernica economica' per la Grecia", foi publicado
em
Il Manifesto
de 09/Março/2010. A versão em inglês encontra-se em
http://mrzine.monthlyreview.org/2010/halevi110310.html
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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